Universo Agro

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DATAGRO

O Clima e a Agricultura

quinta-feira, 24 de janeiro de 2013 - 5h54

*Guilherme Nastari

A produção de açúcar e etanol tem como base a atividade agrícola, que fornece às usinas e destilarias a matéria prima a ser processada – cana, milho, beterraba ou outras culturas. Quantidade e qualidade desta matéria prima dependem do controle de variáveis complexas, que vão do preparo do solo à colheita.  Entretanto, o fator fundamental nesta equação é o clima, que determina temperatura, ventos, regularidade e intensidade de chuvas, dentre outros fenômenos essenciais para o bom desenvolvimento dos campos. Ao longo de 2012, irregularidades climáticas afetaram negativamente a produção de açúcar e etanol em todo o mundo.

A DATAGRO estima que produção de açúcar da União Europeia encerrará a temporada 2012/13 em queda, apesar do ligeiro aumento de 1,9% na área disponível para cultivo de beterraba, totalizando 1,586 milhão de hectares em 2012/13. Condições climáticas fora do normal afetaram a produtividade do continente. Frio excessivo e chuvas na região norte do bloco, combinado à estiagem que assolou lavouras na região sul durante o período de entressafra provocaram quebra de 6% no rendimento agrícola na França e de 5,0% Alemanha. Estima-se que a União Europeia produzirá 17,55 milhões de toneladas de açúcar, queda de 5,3% comparada à última safra. Considerando a produção de isoglicose e parcela da produção fora da quota que não foi utilizada para outros fins em 2011/12 e que passa a ser contabilizada na produção da temporada seguinte, a produção total de açúcar para a safra 2012/13 deve alcançar 19,17 milhões de toneladas, redução de 1,4% em relação à temporada 2011/12.

Assim como a UE, as principais regiões produtoras de açúcar na Rússia também sofreram com a adversidade climática, como a estiagem na região central do país e chuvas acima da média no sul. Como resultado, a produção de 2012/13 poderá alcançar 4,7 milhões de toneladas de açúcar. Caso este cenário se materialize, a Rússia será levada a aumentar a importação de 900 mil em 2011/12 para até 1,2 milhão de toneladas nesta temporada. A menor produção também se deve à retração do plantio de beterraba no país, que caiu de 1,289 milhões de hectares em 2011 para 1,150 milhão de hectares, em decorrência do aumento do preço de trigo contra o recuo do valor do açúcar.

Os EUA tiveram quebras graves nas safras de milho e soja em decorrência da severa estiagem pelo qual passou a região Meio Oeste nos meses de Maio à Agosto. Esta irregularidade climática acabou por impulsionar o preço de commodities, especialmente milho. A produção interna de etanol encolheu diante do preço do grão, fato que refletiu nos preços de etanol americano e impulsionou uma forte recuperação das importações do biocombustível. Desde Julho, portanto, que o etanol norte americano é negociado com prêmio em relação ao valor do produto fabricado no Brasil, o que abriu janela de oportunidade para aquisição do etanol brasileiro. Em Agosto de 2012 os EUA importaram 425,72 milhões de litros de etanol, maior volume já importado pelo país desde o mesmo mês de 2006. No acumulado de Janeiro a Agosto de 2012, o país importou 1,12 bilhão de litros do biocombustível, alta de 115,35% quando comparado ao mesmo período do ano passado. O Brasil forneceu 84,19% do total importado pelos EUA em 2012.

O Brasil também sofreu com intempéries durante 2012. No início da safra, o desenvolvimento de canaviais da região Centro Sul estava atrasado devido às poucas chuvas. Em Fevereiro, o Índice Relativo de Chuvas DATAGRO mediu -43,6% de precipitação, e -39,1% em Março. De Abril à primeira quinzena de Julho o cenário inverteu-se, com excesso de chuvas que possibilitaram recuperação e desenvolvimento acelerado da cana. Durante o período, houve índices de precipitação até 410,0% acima da média histórica. O excesso de chuvas afetou negativamente a concentração de ATR na cana de açúcar e prejudicou o progresso das operações de colheita. Na segunda quinzena de Agosto, a média dos níveis de ATR da safra 2012/13 estavam significativamente abaixo dos encontrados nas últimas três safras. A ausência total de precipitação do fim de Julho à metade de Setembro mudou as expectativas novamente, e permitiu grande progresso nas operações de colheita.

O impacto do clima na agricultura mundial é, portanto, inequívoco, e a possibilidade de uma mudança climática estar em curso torna a questão ainda mais urgente. Tempestades, estiagem, ventos e outros fenômenos são relativamente imprevisíveis, e demandam planejamento dos produtores e todos os outros elos da cadeia de valor do açúcar e etanol para mitigar riscos. Com gestão e tecnologia é possível construir um grau de previsibilidade importante quanto à produção. É preciso estar alerta.

*Guilherme Nastari é mestre em agroenergia e diretor da DATAGRO

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