Armazenamento de carbono é nova oportunidade de renda para usinas de etanol de SP
Atividade pode resultar em ganhos financeiros tanto por meio de créditos de carbono como também pela certificação do biocombustível como “zero emissor” ou “emissor negativo”
DATAGRO
*Por Ronaldo Luiz Mendes Araujo
Uma tecnologia amplamente utilizada no segmento petrolífero para ajudar na extração de petróleo pode aprimorar ainda mais a sustentabilidade do etanol, viabilizando a produção inédita do biocombustível com pegada negativa de carbono. Trata-se do processo de captura e armazenamento do carbono, conhecido mundialmente como CCS (sigla em inglês para Carbon Capture and Storage), que tem como inspiração técnica a injeção de CO2 nos campos petrolíferos para auxiliar na extração do petróleo. Os mesmos equipamentos que injetam carbono para auxiliar o bombeamento do petróleo agora estão prontos para aprimorar a sustentabilidade do etanol que, cada vez mais, substitui a energia de origem fóssil.
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O Brasil tem potencial de captura de carbono em torno de 200 milhões de toneladas de CO2 equivalente por ano, considerando o nível atual de atividade econômica do país. Neste sentido, o mercado brasileiro de captura e armazenamento de carbono no solo tem perspectiva de movimentar entre R$ 14 e R$ 20 bilhões anuais, com participação significativa do setor de etanol, indicam estimativas da CCS Brasil, entidade especializada no tema. Já o mercado mundial de CCS deve movimentar US$ 3,54 bilhões em 2024, com previsão de atingir US$ 14,51 bilhões em 2032.
Com 40% de participação de mercado, os Estados Unidos lideram mundialmente os projetos de captura e armazenamento de carbono, removendo da atmosfera anualmente 22,5 milhões de toneladas de CO2 equivalente, apontam cálculos da consultoria de origem norueguesa Rystad Energy.
Um dos empreendimentos é desenvolvido pela trading ADM no estado de Illinois desde 2011, relatam os executivos Andrew Duguid e Manoj Valluri da Advanced Resources International. De acordo com os especialistas, outro empreendimento de CCS de peso na indústria de etanol norte-americana é o da Red Trail Energy no estado da Dakota do Norte. "Existem hoje mais de 50 novos projetos de CCS em análise para obtenção de licenças na Agência de Proteção Ambiental dos EUA, o que demonstra o potencial deste mercado."
:: Etanol com pegada negativa de carbono
O etanol de cana-de-açúcar produzido no Brasil já reduz em até 90% as emissões de gases que contribuem para as mudanças climáticas. A captura e o armazenamento do CO2 gerado durante o processo de produção do biocombustível faz com que essa pegada de carbono seja ainda menor, chegando a ser negativa.
“As mais de 360 usinas que produzem etanol no Brasil, em particular no Estado de São Paulo, têm a oportunidade de fazer do País o líder global nesse mercado, abrindo as portas para o acesso aos créditos de carbono e criando mais uma fonte de receita para as usinas”, explica o geólogo Everton Oliveira, presidente da Hidroplan, empresa que atua no segmento.
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“A lei do Combustível do Futuro chegou para estabelecer o marco-regulatório de CCS no país, determinando as diretrizes gerais para a atividade. A legislação vai dar o arranque definitivo do assunto no Brasil, destravando projetos já engatilhados, que avançam agora para a fase de real implantação", destaca Isabella Morbach, diretora da CCS Brasil.
:: Créditos de carbono
O gestor de ativos Carlos de Mathias Martins Jr., especializado em créditos de carbono e energias alternativas, explica que a atividade de CCS no setor de etanol pode resultar em ganhos financeiros para as usinas tanto por meio da geração e comercialização de créditos de carbono – seja no âmbito do RenovaBio ou no mercado voluntário, como também pela certificação do biocombustível como “zero emissor” ou “emissor negativo”. Isso permite que o etanol seja monetizado com ágio em mercados internacionais que valorizam este atributo.
“Investidores, fundos de investimento soberanos de países, assim como, claro, empresas prestadoras de serviço na atividade de CCS, estão de olho neste mercado. Não faltarão recursos para bons projetos”, aposta Mathias.
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O valor de mercado dos créditos de carbono lastreados em CO2 armazenado no solo é maior do que créditos provenientes, por exemplo, do replantio de árvores. A explicação vem de um dos principais especialistas brasileiros em captura, transporte e armazenamento de CO2 no subsolo, o geólogo Milas Evangelista de Souza, ex-Petrobras.
O especialista esclarece que o crédito de carbono oriundo da atividade de CCS na produção de bioenergia, como é o caso das usinas de etanol, tem maior valor financeiro por dois motivos: primeiro porque é considerado um crédito de remoção de CO2 da atmosfera e não de redução de emissões; e segundo, porque é capturado, transportado e armazenado de forma segura e permanente, por tempo indeterminado, com baixo risco de seu retorno à atmosfera – diferentemente do reflorestamento, que é suscetível ao desmatamento e às queimadas, podendo liberar novamente o CO2 para a atmosfera. “Por isso, ao ‘confiar’ mais na eficácia, na entrega ambiental do crédito de carbono de CCS, que ficará estocado eternamente em reservatórios geológicos, o mercado majora seu preço.”
A consultora norte-americana em energia Sallie E. Greenberg, Ph.D. com mais de 25 anos de experiência em gestão de carbono, reforça: "o CCS no etanol impede a entrada na atmosfera de carbono que, de outra forma, seria emitido. O CO2 gerado na produção de etanol é ainda o mais indicado para armazenamento porque se trata do mais puro, com elevada concentração de carbono com um pouco de água. Isso o torna facilmente capturável e desidratado quando a água é removida".
:: RenovaBio: Crédito de descarbonização lastreado em armazenamento de carbono eleva nota das usinas de etanol
O processo de captura, transporte e armazenamento de CO2 no subsolo está previsto na lei da Política Nacional de Biocombustíveis (RenovaBio) e pode significar oportunidade para a geração de um maior volume de Créditos de Descarbonização (CBios) e consequentemente de renda para as usinas de etanol.
“O RenovaBio originalmente prevê um bônus de até 20% na nota de eficiência energética para as unidades produtoras de etanol que emitirem CBios lastreados no armazenamento de carbono no solo, permitindo assim a possibilidade da emissão de mais títulos por parte das usinas”, pontua Evangelista de Souza.
:: Armazenamento de carbono também é oportunidade para usinas de etanol de milho
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Em uma de suas plantas, localizada no município de Lucas do Rio Verde (MT), a FS está implantando um projeto pioneiro de CCS, que até o momento recebeu cerca de R$ 460 milhões em investimentos, com estimativa de conclusão em junho de 2026. O projeto consiste na captura do CO2 emitido durante a fermentação do milho, etapa final da produção do etanol, e posterior estocagem no subsolo.
Lopes destaca que o retorno do investimento virá da venda de créditos de carbono – tanto no mercado voluntário quanto no âmbito do RenovaBio -, bem como de prêmios, pagos em mercados internacionais, por exemplo, pelo etanol de pegada negativa de carbono. "Há um grande potencial para este tipo de biocombustível para fabricação de combustível sustentável de aviação, o chamado SAF, e marítimo também."
:: Combustível do Futuro: armazenamento de carbono abre nova fronteira de negócios para as usinas de etanol, destaca deputado Arnaldo Jardim
Relator na Câmara dos Deputados do Combustível do Futuro, o deputado federal Arnaldo Jardim (PPS-SP), destaca as oportunidades que a nova legislação traz para as usinas de etanol a partir da atividade de captura e armazenamento de carbono, que recebeu capítulo específico na recém-sancionada lei. Na entrevista a seguir, ele dá mais detalhes sobre esta nova fronteira de negócios que o CCS traz para as usinas de etanol.
1) A atividade de CCS consta do Combustível do Futuro. Como o senhor enxerga as oportunidades da tecnologia para o setor sucroenergético?
O setor sucroenergético brasileiro, em particular o etanol tem a digital, o “DNA” de ser sustentável. Produz biocombustível limpo e renovável e no elo da lavoura é ancorado em boas práticas, com mecanização das tarefas, aproveitamento de resíduos e sobras que são transformados em fertilizantes, bem como funcionam como matéria-prima para geração de energia elétrica, e assim por diante.
A nova lei vai dar o impulso definitivo do tema no Brasil, destravando projetos já engatilhado. O avanço do armazenamento de CO2 no solo no âmbito do segmento da cana só vai reforçar ainda mais a sustentabilidade do setor.
2) O CCS tem potencial para elevar ainda mais a sustentabilidade do etanol brasileiro, permitindo até a pegada de carbono negativa?
Deputado federal, Arnaldo Jardim
Crédito: Mário Agra/Agência Câmara
Uma importante técnica que pode realizar a neutralização de carbono é o uso da biomassa combinada com o CCS, chamada de Bio-CCS (bioenergy with carbon dioxide capture and storage). A biomassa utilizada para biocombustíveis é proveniente de plantas, ou seja, durante seu crescimento já há a captura de carbono, mas este é novamente lançado na atmosfera quando convertido em energia, mesmo que em quantidades menores que os combustíveis fósseis.
Entretanto, se este CO2 for capturado e transportado para um local de estoque permanente, como o subsolo, isso irá resultar em uma remoção negativa de CO2, ou seja, será capturada uma quantidade maior do que foi emitido. O carbono gerado na fabricação de etanol está praticamente pronto para ser estocado, devido ao seu elevado grau de concentração – diferentemente de outros setores em que o CO2 precisa ser separado de outros gases.
3) As usinas poderão ter adicional de renda com a implantação da atividade de CCS em suas operações de fabricação de etanol?
A atividade de CCS no setor de etanol pode resultar em ganhos financeiros para as usinas tanto por meio da geração e comercialização de créditos de carbono como também pela certificação do biocombustível como “zero emissor” ou “emissor negativo”. Isso permite que o etanol seja monetizado com ágio em mercados internacionais que valorizam este atributo.
O processo de captura, transporte e armazenamento de CO2 no subsolo, ou CCS (captura e armazenamento de carbono em inglês), está previsto na lei da Política Nacional de Biocombustíveis (RenovaBio) e pode significar oportunidade para a geração de um maior volume de Créditos de Descarbonização (CBios) e consequentemente de renda para as usinas de etanol.
4) A novidade pode atrair novos investimentos internacionais para o setor sucroenergético e consequentemente para o agro brasileiro?
Certamente. O Brasil é o país mais bem posicionamento quando falamos de descarbonização e transição energética. Nosso potencial nesta questão é gigantesco porque combina oportunidades concretas de produção de energia limpa e renovável em diversas rotas, o que vai ao encontro da agenda global.
É uma oportunidade importante de levar esse assunto às usinas de processamento de cana, que podem se beneficiar muito adotando o CCS e com isso, ganhando mais uma alternativa de geração de receitas. É mais uma forma de promover a economia circular, já tão praticada pelo setor sucroenergético, onde nada é desperdiçado e cada resíduo é aproveitado. Não é por acaso que a produção de etanol no Brasil é a mais sustentável do mundo, e com o CCS essa sustentabilidade pode se tornar ainda mais impactante e significativa.
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